O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), órgão deliberativo e controlador das políticas de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente no Brasil, na forma da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, criado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069 de 1990) e instituído pela Lei 8.242 de 1990, o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), instância autônoma de controle social e estratégia da sociedade brasileira de articulação e aglutinação de atores sociais institucionais, comprometidos com políticas e programas de prevenção e erradicação do trabalho infantil no Brasil, juntos, vêm, mediante avaliação situacional do trabalho infantil, suas condições geradoras e sua política de prevenção e erradicação, manifestar-se por ocasião da data de 12 junho, dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil.
Em avaliação situacional, e pelo prejuízo ao correto seguimento das atividades do III Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador (2019-2022), é relevante pontuar a atual dificuldade na realização de diagnósticos e mapeamentos em face da ausência de divulgação de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) sobre o trabalho Infantil desde o ano de 2016, ano de publicação dos dados coletados em 2016. Instrumento indispensável ao diagnóstico e mapeamento desta grave forma de violação de direitos das crianças e adolescentes, a pesquisa feita em 2016 levantou 2,4 milhões de meninos e meninas de 5 a 17 anos trabalhando em atividades proibidas pela legislação. Até 2017 as PNADs de trabalho infantil foram divulgadas com periodicidade anual, em série histórica iniciada em 1992.
É urgente, ainda, a necessidade de aprofundamento das políticas públicas indispensáveis à prevenção e ao combate ao trabalho infantil para que o Brasil possa atingir a meta de erradicação até 2025. Esse é um compromisso assumido no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS, da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ODS 8.7). Mesmo em um contexto de contenção de despesas, em qualquer das esferas da federação, a absoluta prioridade na alocação de recursos, prevista na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, deve ser observada de forma permitir a contínua expansão e fortalecimento das políticas públicas destinadas a assegurar os Direitos das Crianças e dos Adolescentes e, em especial, o combate ao trabalho infantil. É preciso ter ciência que o trabalho infantil acarreta sérias consequências às suas vítimas, podendo ser elas permanentes, como o comprometimento do desenvolvimento integral, trazendo danos físicos e psicológicos às crianças e adolescentes.
Para o contexto de 2020, destacamos que a pandemia gerada pela COVID-19 irá impactar em uma crise de empregabilidade, com consequências ainda mais significativas para as populações vulneráveis e hipervulneráveis, agravando as situações engendradoras do trabalho infantil. A pandemia traz um cenário de crise gerada pela perda da renda familiar, perda do acesso à educação e também, as dificuldades ao acesso ao sistema de saúde. Estamos tratando de um contexto de crianças e adolescentes pobres, em sua maioria negros, que terão seu futuro ceifado por uma dura realidade de sobrevivência. Por isso, governo e sociedade civil, devem criar medidas estratégicas, de prevenção e monitoramento de novas frentes desafiadoras para esta modalidade de violação de direitos, das quais destacamos a possibilidade de evasão escolar e novos riscos ocupacionais em empregos tradicionalmente seguros.
É, de fato, urgente e necessária a adoção de medidas que garantam acesso à educação e ao ensino obrigatório à distância no contexto da pandemia, seja pelo uso da internet, seja por meio da rede de rádio e televisão, sem que isso impeça a avaliação da tendência ao agravamento das desigualdades de acesso, manutenção e progresso educacional já existente no Brasil, afetando especialmente as populações mais pobres e em municípios e comunidades mais afastadas dos grandes centros e eixos de desenvolvimento do país, conforme alertado pelo CONANDA
As medidas adotadas para a continuidade do ensino obrigatório à distância, seja pelo uso da internet, seja por meio da rede de rádio e televisão, agravará a desigualdade de acesso à educação já existente no Brasil, afetando especialmente as populações mais pobres e em municípios e comunidades mais afastadas dos grandes centros e eixos de desenvolvimento do país, conforme já alertado pelo CONANDA na Carta nº 41/2020. Nesse sentido, a reposição das aulas em modalidade presencial no ensino obrigatório é medida necessária para assegurar a educação de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, prevenindo e quebrando o ciclo do trabalho infantil.
Por outro lado, o Brasil aponta na população um número de 183 mil trabalhadores com menos de 18 anos em situação de emprego formal para o mês de abril de 2020. Estes trabalhadores e trabalhadoras, que normalmente estariam em condições de segurança e em funções condizentes com a sua situação de pessoa em desenvolvimento, podem agora estar trabalhando sob o risco de contaminação pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2). Seja em atividades essenciais ou não, o risco de desenvolvimento da COVID-19 não é compatível com as normas de proteção do trabalho dos adolescentes. Esse risco se dá tanto nas diversas situações de prestação presencial de serviços, como no próprio deslocamento do trabalhador adolescente, entre sua casa e seu trabalho ou entidade formadora de aprendizagem, nos termos já expostos pela recomendação do CONANDA de 25 de março de 2020. Assim, enquanto houver situações de risco à saúde física e psicológica do adolescente trabalhador, devem ser adotadas medidas protetivas disponíveis na legislação trabalhista, especialmente a vedação de atividades presenciais.
Por fim, é imperioso consignar a preocupação com a extinção da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (CONAETI) pela Portaria da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho n.º 972, de 21 de agosto de 2019, sem que tenha sido reinstalada até esta data. A formulação da política pública de prevenção e erradicação do trabalho infantil deve observar que os direitos das crianças e adolescentes constituem um dever para o Estado, a família e a sociedade, por determinação expressa da Constituição Federal. Assim, é imprescindível que a CONAETI seja instalada e na sua composição seja a sociedade civil incluída como um ator indispensável para a prevenção e a erradicação do trabalho infantil. Feitas estas observações, reafirmamos a urgente necessidade da reinstalação da CONAETI, em formato multilateral, com a imprescindível participação da sociedade civil em sua instância decisória. A coordenação da CONAETI deve permanecer com a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério da Economia, dirigida por servidores de carreira de estado e menos sujeitos à interferência política.
Assinado eletronicamente
IOLETE RIBEIRO DA SILVA
Presidente
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA
Brasília, 09 de junho de 2020.