Donos da fazenda de ‘Terra e Paixão’ têm terra flagrada com trabalho escravo e infantil

A novela “Terra e Paixão” chegou ao fim no dia 19 de janeiro de 2024. No último capítulo da trama de Walcyr Carrasco, o vilão Antônio La Selva (Tony Ramos) é morto por seu ex-capanga Ramiro (Amaury Lorenzo), após fugir da cadeia e tentar invadir o casamento de seu filho Caio (Cauã Raymond) com a professora Aline (Bárbara Reis). O folhetim encerra com um final feliz dos mocinhos, em meio à narração do pajé Jurecê, vivido pelo ator e escritor indígena Daniel Munduruku.

Na vida real, os finais nem sempre são felizes para quem vive cercado pelo latifúndio. Em 2020, uma inspeção na Fazenda Salto, no município de Nioaque (MS), conduzida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), encontrou quinze trabalhadores em situação degradante — oito menores de 18 anos e três paraguaios. Três deles tinham 15 anos, o que configura trabalho infantil. O imóvel pertence à Valor Commodities, um dos maiores grupos comercializadores de grãos, carne e pescados do Mato Grosso do Sul, também dono da Fazenda Annalu, que recebeu as gravações da novela “Terra e Paixão”.

Em uma série de reportagens, De Olho nos Ruralistas mostrou o histórico de violações ambientais na fazenda usada pela Rede Globo e em outras propriedades da família Rocha, dona do Grupo Valor. A investigação mostrou as conexões políticas do diretor da empresa Aurélio Rolim Rocha, ex-assessor da ministra Tereza Cristina, além de expor as dívidas milionárias da empresa junto às multinacionais Bunge e Seara, que pediram a penhora dos valores pagos pela emissora carioca para gravar na Fazenda Annalu.

A lista de violações encontrada pelo MPT em Nioaque é extensa. As vítimas não recebiam equipamentos adequados para o manejo de agrotóxicos, tampouco tinham acesso a água e sabão para se lavarem após o contato com as substâncias tóxicas. O observatório do agronegócio De Olho nos Ruralistas teve acesso ao texto da denúncia, que reporta como os trabalhadores eram “forçados a viver em barracos de lona, numa estrutura totalmente improvisada em um curral, dormindo em camas feitas com tábuas e fazendo suas necessidades fisiológicas num buraco, ou então no mato”.Trabalhadores faziam necessidades em um buraco no chão, cercado com lona. / MPT

O documento revela que o banheiro, improvisado com lonas plásticas e sem teto, estava bastante sujo no momento da inspeção, tornando seu uso inviável. De acordo com o relato dos trabalhadores, a falta de higiene e segurança deixava-os expostos ao ataque de animais peçonhentos, como cobras e escorpiões, comumente encontrados na região.

Em uma segunda vistoria, realizada em outubro de 2022, os fiscais encontraram alojamentos ainda precários. Os quartos, divididos por várias pessoas, eram cubículos mal ventilados e com quase nenhum espaço entre as camas. Paredes sem pintura e ausência de armários completavam o cenário insalubre.

Pela jornada diária de até nove horas de trabalho — de segunda a sábado — os empregados recebiam entre R$ 50 e R$ 60 por dia. Somado o tempo de deslocamento, ficavam à disposição dos contratantes por quase 12 horas diárias. O MPT constatou ainda que os empregadores não realizavam o depósito mensal do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Entre as obrigações dos trabalhadores, estava a limpeza do solo para o plantio de soja. Para isso, eles recolhiam pedras e raízes com as próprias mãos.

Leia reportagem completa no Brasil de Fato

 

Visualizações: 0