O Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil FNPETI lançou, na segunda-feira (21), o estudo “O trabalho infantil no Brasil: análise dos microdados da PnadC 2019”. Participaram da live de lançamento o consultor responsável pela publicação, Guilherme Araujo, o membro fundador a Agenda 2030 e economista da Gestos, Claudio Fernandes, e a secretária executiva do FNPETI, Isa Oliveira.
Entre 2016 e 2019, o número de crianças e adolescentes no Brasil caiu de 2,2 milhões para 1,8 milhão. “Esse é um indicador claríssimo de que, antes da pandemia – e do agravamento da crise socioeconômica, do maior empobrecimento das famílias e do aumento da vulnerabilidade – já havia um risco concreto e objetivo de não alcançarmos a eliminação de todas as formas do trabalho infantil em 2025”, analisou Isa Oliveira, referindo-se ao compromisso do Brasil com o cumprimento da Meta 8.7 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
“Isso é extremamente grave e a observação dos que estão na ponta é de confirmação de que há um aumento do trabalho infantil. É um momento realmente de muita preocupação, de um alerta que foi confirmado pela divulgação das estimativas globais pela OIT. Temos agora que agir, fortalecer a nossa indignação e a nossa incidência política para impedir esse grave retrocesso social que é o crescimento do trabalho infantil e o distanciamento cada vez maior da Meta 8.7”, avaliou.
Regiões
De acordo com o estudo, em 2019, havia 1,8 milhão de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil. Do total. 600 mil estão na região Sudeste, 570 mil no Nordeste, 264 mil no Sul, 239 mil no Norte e 159 mil no Centro-Oeste.
Racismo estrutural
O racismo estrutural é um componente fundamental do trabalho infantil. Mais de 1,2 milhão de crianças e adolescentes no trabalho infantil são negros, contra 630 mil de não negros.
“Sem dúvida, o trabalho infantil é resultado da desigualdade social e de milhões de famílias em situação de pobreza. O trabalho infantil no Brasil tem classe e tem cor, porque o racismo estrutural é uma de suas causas e a essas se somam a naturalização, a indiferença com que o poder público e a sociedade olham ou não olham para este problema”, argumentou Isa.
Piores formas
Do total, 704 mil (38,4%) exerciam alguma das piores formas de trabalho infantil, ou seja, atividades que prejudicam a saúde, a segurança e o moral de crianças e adolescentes. Essas atividades constam na lista TIP, ratificada pelo Brasil em 2008.
Dos 1,5 milhão de adolescentes em situação de trabalho infantil, 1,4 milhão estavam em trabalhos informais.
Afazeres domésticos
De acordo com o estudo, 19,8 milhões de crianças e adolescentes brasileiros (51,8% do total nessa faixa etária) realizam afazeres domésticos. A média de tempo dedicado a essas atividades é de 7,7 horas semanais. Cerca de 1,4 milhão (78,1%) dos trabalhadores infantis realizam fazeres domésticos por 18,3 horas por semana. Portanto, crianças e adolescentes trabalhadoras podem ter 50% do dia comprometido com o trabalho e com afazeres domésticos.
Trabalho infantil e desigualdade social
De acordo com Claudio Fernandes, o trabalho infantil é um problema estrutural diretamente ligado à pobreza e à desigualdade social. Para ele, o país não pode ser considerado desenvolvido enquanto houver trabalho infantil em seu território.
“O Brasil é um país de extrema desigualdade, o que significa que existe um contingente populacional numa situação vulnerável economicamente, socialmente, culturalmente, educacionalmente e o Estado brasileiro não consegue cumprir todas as suas obrigações como estão estipuladas na Constituição e nas emendas posteriores. Se o pais não cuida de suas crianças, elas se tornarão adultos que não conseguem cuidar de si nem do Brasil ”, ressaltou o economista.
Claudio evidenciou o papel da Agenda 2030 e dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável como roteiro para o enfrentamento das mazelas que acometem o Brasil. Ele defendeu também uma reforma tributária que desonere as camadas mais vulneráveis da população.
“O sistema tributário privilegia o aumento da desigualdade e da pobreza porque as pessoas com menor renda pagam proporcionalmente muito mais impostos do que pessoas com maior renda. Para se começar um processo de desenvolvimento sustentável, precisamos de uma reforma tributária que comece a distribuir renda”, acrescentou.
Agenda de combate ao trabalho infantil
A secretária executiva do FNPETI destacou durante a live a importância de fortalecer as ações de combate e prevenção ao trabalho infantil durante a pandemia e reforçou que o estudo integra a programação do 12 de Junho, Dia Mundial contra o Trabalho Infantil, e do Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil.
“Socializar as informações para qualificar o debate é uma das formas de contribuição do Fórum Nacional. Também é importante nesse cenário em que vivemos fortalecer as nossas articulações para uma incidência política firme, para exigir que o Estado brasileiro inclua a eliminação do trabalho infantil como uma prioridade, destinando recursos e assegurando a proteção integral de todas as crianças e adolescentes brasileiros e uma renda básica digna, que assegure dignidade às famílias brasileiras”.